Slide

10/recent/ticker-posts

Carta de filhos enlutados pela morte da mãe



Fim do silêncio após barbárie. Filhos de Arlete Negrão relatam, em carta, que ela morreu ao proteger irmã do assassino, que foi morto.
Foto: Clemilson Campos / JC Imagem.

Dez dias após a tragédia em um prédio de luxo no bairro de Parnamirim, na Zona Norte do Recife, a família da aposentada brutalmente assassinada a socos e pontapés pelo vizinho – que também esfaqueou a irmã – quebrou o silêncio. Os seis filhos de Arlete de Souza Negrão, 64 anos, assinaram uma carta em tom de desabafo, na qual clamam por paz e revelam que Arlete foi assassinada tentando proteger a irmã do agressor.

De acordo com o texto, o vizinho da aposentada Herbert Lucas Abreu Mendes, 22, entrou na casa dela arrombando a porta a chutes. O acusado resolveu invadir o local depois que Arlete abrigou a irmã dele, Samara Abreu Mendes, 18, que, ensanguentada, pediu ajuda no apartamento ao lado.

A carta também relata que as brigas no apartamento 203 – onde Herbert, Samara, um outro irmão e os pais moravam – eram frequentes. Arlete, segundo os filhos, após voltar da missa, no Sábado de Carnaval, “foi surpreendida com mais um tumulto vindo do apartamento 203. Gritos e pancadarias eram comuns no apartamento vizinho. Por diversas vezes, quando eram menores, ela interveio para apaziguar a briga entre os irmãos que passavam o dia inteiro sozinhos, enquanto os pais emendavam maratonas de plantões no trabalho.”

Para a família da aposentada, ela salvou Samara da morte. “Lucas, de 22 anos, após tentar matar a irmã e a mãe, arromba o apartamento de nossa mãe com chutes e a espanca com as suas mãos e os seus pés, sem nenhum objeto, apenas motivado pelo ódio, força e fúria. Arlete consegue livrar Samara da morte e é cruelmente espancada”, relata um dos trechos da carta.

O crime ocorreu na noite do sábado de Carnaval. Relatos de testemunhas dão conta que Herbert Lucas chegou ao edifício onde morava, Maison Chagall, na Rua Guedes Pereira, sem roupa e pulou o muro. Já em casa, no apartamento 203, brigou com a mãe e esfaqueou a irmã. Depois, invadiu o apartamento 204, de dona Arlete. Ela morava com a filha mais nova, que não estava em casa. Ele espancou a idosa, que morreu em decorrência de hemorragia interna resultado das pancadas, na manhã do dia seguinte.

Foto: Clemilson Campos/ Reprodução.

O jovem seguiu para o quarto andar, onde invadiu o apartamento 403, do auditor fiscal João Francisco de Lima Cruz, que terminou matando Herbert Lucas com um tiro. Os filhos de Arlete também defendem a atitude do auditor, que chegou a ser autuado em flagrante por homicídio, mas depois foi solto mediante decisão judicial.

“Infelizmente, no momento do ocorrido, não existia em nosso apartamento alguém como o Sr. João que conseguiu defender bravamente sua família em seu lar, após ter sua porta também arrombada por esse assassino em fúria.”

Naturais do Ceará, desde o brutal assassinato de Arlete, os filhos foram para o estado em que nasceram e onde ocorreu o enterro da aposentada. No último sábado, participaram da missa de sétimo dia da mãe.

Os parentes da idosa estão assustados, até porque essa é a segunda grande tragédia vivida pela família. Em 1994, o marido de Arlete foi assassinado no Ceará. A partir daí, a aposentada começou a criar sozinha os seis filhos: Eliza Raquel, Eliza Renata, Rosana, Davi, Robson e Francisco.

O crime está sendo investigado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil. Procurado pela reportagem, o delegado responsável pelo caso, Francisco Diógenes, afirmou que não falaria sobre o assunto. No entanto fontes da Secretaria de Defesa Social informaram que o inquérito deve ser concluído nos próximos dias.

Abaixo, a carta dos filhos na íntegra:

Filhos enlutados clamam pela paz após morte brutal de sua mãe

Quem imaginaria que seu próprio lar não seria o local mais seguro para passar o Carnaval?

Arlete de Souza Negrão, havia voltado da missa, como habitual, no sábado de Carnaval no bairro do Parnamirim. Foi surpreendida com mais um tumulto vindo do apt 203, gritos e pancadarias eram comuns soarem do apartamento vizinho. Por diversas vezes, quando eram menores, ela interveio para apaziguar a briga entre os irmãos que passavam o dia inteiro sozinhos, enquanto os pais emendavam maratonas de plantões no trabalho.

Dessa vez não foi diferente, Samara Abreu Mendes, de 18 anos, após ser agredida e esfaqueada pelo irmão mais velho Lucas Hebert Abreu Mendes, que, segundo testemunhas, estava drogado e voltava de uma festa de Carnaval, pede abrigo a Arlete. Lucas, de 22 anos, após tentar matar a irmã e a mãe, arromba o apartamento de nossa mãe com chutes e a espanca com as suas mãos e os seus pés, sem nenhum objeto, apenas motivado pelo ódio, força e fúria. Arlete consegue livrar Samara da morte e é cruelmente espancada. Podemos imaginar o pavor, o terror, o medo e o sofrimento físico em seu rosto. A dor de imaginarmos não ter ninguém ali naquele momento para defendê-la ou socorrê-la é imensa. Nossa mãe sofreu traumatismo craniano, fraturou costelas e bacia, uma hemorragia interna provocada por lesões graves no fígado, baço e rins, além da face desfigurada e irreconhecível.

Era uma idosa sim, mas que gozava de muita saúde, sem vícios ou doenças crônicas, apenas a fragilidade da própria idade. Era viúva, teve seu marido também assassinado em 1994, passando a cuidar dos seus seis filhos sozinha desde os 46 anos. Era muito religiosa, orava diariamente, ia à Igreja todos os dias, lia a Bíblia e educou seus filhos na fé e no amor, ensinando-lhes o caminho do bem. Mudou-se do Ceará para Recife para que seus filhos estudassem. Formou 04 médicos, 01 advogado e 01 dentista, todos em universidades públicas. A última filha conclui o curso de Medicina em 27-02-12 pela UFPE, cumprindo assim o seu honrado papel de mãe.

Nós, filhos de Arlete, estamos indignados! Uma mãe como essa, que nunca agrediu nenhum de seus próprios filhos, tinha que sofrer tamanha atrocidade pelas mãos de um assassino tão brutal? Filho de pais que não conseguiram ensinar o caminho do amor, da paz, da obediência, do bom exemplo... As drogas invadiram a nossa família de uma forma cruel e injusta sem sermos usuários e nem estarmos em ambientes expostos. Trata-se de uma mãe, em seu lugar mais sagrado e seguro, agredida até a morte por um rapaz que não foi ensinado sobre as verdadeiras regras da vida.

Esse rapaz foi sim uma vítima, mas dos próprios pais que foram omissos e ausentes em sua boa educação e não souberam ou não quiseram enxergar os verdadeiros problemas do filho. Somente esses pais poderiam ter evitado tamanha tragédia, poderiam ter evitado que outras famílias sofressem e pagassem pelos seus erros.

Infelizmente, no momento do ocorrido, não existia em nosso apartamento alguém como o Sr. João que conseguiu defender bravamente sua família em seu lar, após ter sua porta também arrombada por esse assassino em fúria.

Esse ano ainda nascerão mais dois netos de Arlete e eles aprenderão sobre a importância do amor, da fé, da paz e dos bons caminhos que devem ser seguidos. Tudo que Arlete ensinou a seus filhos será ensinado aos seus netos, os verdadeiros valores da vida.

Desejamos que toda essa barbaridade sirva de alerta a todos os pais, que fiquem atentos e tomem atitudes verdadeiras em relação aos problemas dos seus filhos, sejam eles relacionados a drogas ou não. A omissão, essa também é um crime!

Ceará, 27 de Fevereiro de 2012

FILHOS DE ARLETE DE SOUZA NEGRÃO

Eliza Raquel Negrão Grangeiro
Eliza Renata Negrão Grangeiro
Rosana Negrão Grangeiro
Davi Negrão Grangeiro
Robson Negrão Grangeiro
Francisco Negrão Grangeiro

Fonte: JC

Postar um comentário

0 Comentários